11.5.06

A Mulher, a Cidade Maringá e a Sensibilidade

Por TANIA TAIT

Na formação de Maringá as mulheres tiveram um papel preponderante, muitas vezes ignorado. Ao acompanhar seus maridos, pais e familiares a uma terra nova e agreste, deixaram de lado o conforto de suas casas e vieram construir uma nova cidade em meio ao mato e ao barro.
As dificuldades logo ficaram latentes e embasaram a visão de sonho dessas mulheres: problemas de infra-estrutura (água de poço, pouca iluminação, tratamento médico dificultado, entre outros); preocupação com a educação dos filhos; medo da violência; moradias precárias; eram encontrados no nascimento da cidade.
Paralelo a essas dificuldades, as mulheres pioneiras desenvolveram um grande espírito de solidariedade configurado em ações práticas, na participação de eventos e cuidados com aqueles que chegavam à nova terra. No período, a participação feminina no mercado de trabalho era restrita ao magistério, enfermagem e um pouco no comércio. Já havia a presença forte de prostituição na cidade.
Em uma terra estranha, com pessoas advindas de várias regiões e culturas diferentes; com pessoas de toda “espécie”, inclusive os famosos jagunços; as mulheres desenvolveram, devido às circunstâncias, duas situações aparentemente contraditórias: força e medo. Medo do isolamento em que viviam e força para enfrentar as adversidades da vida que estavam começando aqui.
Entretanto, as mulheres pioneiras persistiram e com sua capacidade de interação com a nova realidade passaram a contribuir com a formação de Maringá. Relatos dessas mulheres demonstram o orgulho de ter estado aqui desde o início e terem construído sua família e suas vidas na cidade (**).
Hoje, Maringá é uma cidade que reflete a mesma situação das mulheres no Brasil e no mundo. Somos a maioria da população, estamos nos qualificando mais do que os homens em nível de grau de escolaridade e, aviltantemente, as mulheres continuam a receber salários menores no exercício das mesmas funções que os homens.
A violência contra a mulher em Maringá apresenta altos índices, mesmo com o reconhecido trabalho realizado pela Secretaria da Mulher e pelo Conselho Municipal da Mulher de Maringá na luta pela não-violência contra as mulheres e na formação da rede de atendimento às mulheres vítimas de violência. Homens de todas as classes sociais e raças continuam se sentindo donos do corpo e da alma das mulheres e, por isso, são violentos. Aliado a isto, o fato da impunidade dada por uma lei que trata os homicídios de mulheres e os atos de violência de forma morosa e, em muitos casos, transformando a vítima em causadora da própria violência.
Na área de saúde, as mulheres são as que mais sofrem, por serem as maiores usuárias. São elas que acompanham os membros da família que precisam de cuidados médicos; são elas que engravidam e necessitam de acompanhamento integral. Não é necessário tecer comentários sobre a saúde em Maringá, pois a situação caótica é bastante visível. Para se ter uma idéia, recentemente, foram divulgados dados oficiais sobre a mortalidade materna, a qual aumentou consideravelmente em relação aos anos anteriores (em 2003 e 2004, ocorreu 1 caso em cada ano). Em 2005, os índices saltaram para 6 mortes maternas, das quais, pela avaliação dos profissionais de saúde, 3 mortes poderiam ter sido evitadas, o que, ainda, deixa o índice de mortalidade materna alto, em relação ao índice nacional. Essa grave situação fez com que surgisse a necessidade de uma atuação integrada entre a Secretaria da Mulher e a Secretaria de Saúde, no atendimento integral à saúde da mulher.
Enfim, em todas as áreas, as mulheres estão presentes, no entanto, muitas vezes, o poder público e a sociedade em geral, não consideram aspectos relativos à totalidade da atuação da mulher: em casa, no trabalho, na escola, com sua saúde e sexualidade. E, tanto o poder público como a iniciativa privada são muito “masculinos” em termos de postura e número de participação das mulheres nos processos de decisão.
Aí, aparece o componente “sensibilidade”. A sensibilidade significa olhar para as mulheres como cidadãs; estabelecer políticas públicas para atender as mulheres e fortalecer a luta pelo fim da discriminação contra a mulher. Significa que a sensibilidade não é característica apenas de mulheres. Os homens também possuem sensibilidade para compartilhar com as mulheres a construção de um mundo igualitário, da mesma forma que compartilharam a formação de uma cidade que tem os componentes “mulher e sensibilidade de artista” em seu nome, Maringá.

(*} Tania Fatima Calvi Tait, Professora do Departamento de Informática da UEM; Coordenadora da ONG Maria do Ingá – Direitos da Mulher. E-mail: tait@din.uem.br

(**) depoimentos no artigo “O Olhar Feminino sobre a Formação de Maringá”, da própria autora, no livro Maringá e o Norte do Paraná, organizado por Reginaldo Dias e José Henrique R. Gonçalves, Editora da UEM: 1998.

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