Toda nudez será castigada
Por MARIA NEWNUM
Em Maringá uma jornalista foi demitida após serem exibidas na internet fotos em que ela celebrava o ritual mais singelo que une homens e mulheres. E o que se festeja entre quatro paredes só diz respeito aos amantes. E certamente foi por estar envolvida pela cumplicidade gostosa que explode nos poros e na alma dos amantes que sob os lençóis não se lembram da existência de outro “mundo” senão, e tão somente aquele “mundo sagrado” das quatro paredes, que ela deixou-se fotografar.
Nenhum profissional que goze de suas faculdades mentais chega pela manhã e corre para sala do chefe para prestar-lhe relatório do que festejou no seu “mundo sagrado”. Só uma pessoa demente faz isso. Do mesmo modo espera-se que nenhuma empresa ou chefe saudável exija isso.
A jornalista em questão é física e mentalmente saudável, linda e competente. Mas assim mesmo foi demitida, castigada por sua nudez; a nudez explicita no relatório sexual do ex-qualquer coisa dela. Porque não dizer ex-amante? Não! Quem ama ou amou por anos, por uma noite ou 15 minutos, não faz isso. E observe-se, o relatório sexual era dele e não dela. Ela apenas teve a infelicidade de estar nele.
O ex não merece atenção, ela de certo já o superou e o grupo de pessoas que viu as fotos já deve lhe ter concedido um “título” a sua altura. A atenção deve voltar-se para a empresa. Ora vejam! Uma empresa de comunicação; a liberta imprensa, senhora de suas conquistas de liberdade plena. Todavia, como a jornalista não deveria ser julgada pela exibição criminosa de sua imagem, a empresa também não, pois na verdade ela ainda carrega o ranço do medo de outros tempos. Para entender melhor esse medo é necessário refletir a história do Brasil e quem sabe esperar por uma reconsideração da demissão da jornalista.
Em sua tese de doutorado sob o título: Cães de Guarda: Jornalistas e Censores do AI-5 à Constituição de 1988 - publicada pela editora Bomtempo, a historiadora Beatriz Kushnir desvendou o universo de jornalistas e órgãos de imprensa colaboradores da ditadura militar pós-68. A autora investigou a promíscua relação entre jornalistas e policiais, bem como os “esquemas” das empresas de comunicação para seguirem um roteiro de autocensura e assim, dançar no ritmo imposto pelo governo militar.
O foco do estudo foi averiguar a cumplicidade de profissionais da comunicação com os censores no Brasil de 1968 a 1988, concluindo que de fato muitos jornalistas atuavam como censores federais, ou seja, como jornalistas foram excelentes policiais nas redações. Em entrevista ao repórter Carlos de Melo do Conservatório da Imprensa ela diz: “Assim como nem todas as redações eram de esquerda, nem todos os jornalistas fizeram do ofício um ato de resistência ao arbítrio”.*
Dentre os jornais investigados pela autora, aparece a Folha da Tarde, o qual concluiu o estudo foi entre 1967 e 1984 reduto de um grupo de profissionais da imprensa chamados “cães de guarda”, pois conduziam a redação como uma delegacia de polícia. Segundo a autora, “o jornal ficou conhecido no meio jornalístico como o jornal de maior ‘tiragem’, uma ironia à grande presença de ‘tiras’ na redação”. *
Via-se, portanto, nesse período a conhecida lei: “Manda quem pode, obedece quem tem juízo”. Com a superação dos períodos da ditadura os que resistiram sem vender a alma, ajudaram a construir o aquilo que se conhece hoje como a “liberdade de impressa”. O país ganhou, todos os jornalistas ganharam entre eles os “cães de guarda”, retratados pela autora. Por tudo isso explica-se a mobilização contrária a tentativa da criação de uma agência reguladora dos meios de comunicação proposta pelo governo recentemente.
Hoje, entende-se que os profissionais da imprensa possuem “liberdade” para desempenhar seus papéis de informar. Nesse sentido as empresas de comunicação também atuam como parceiras-cúmplices de seus profissionais. Em outras palavras, o rádio, a revista ou o jornal zela pelo bem-estar de seus profissionais dando-lhes o suporte necessário ante as possíveis pressões ou e retaliações que possam surgir por parte dos governos ou da “ditadura” ferrenha da opinião pública. Mesmo e inclusive quando forem afetados fora do ambiente de trabalho, visto que pelo trabalho especifico que exercem tornam-se pessoas públicas.
Daí a diferença de repercussão das fotos da jornalista. Se ela fosse, por exemplo, auxiliar administrativo ou balconista o crime cometido contra ela não provocaria o medo em mantê-la no cargo. Não foi o caso, porque ela carrega sobre si o peso de pessoa pública advinda da sua função exercida no jornal, por isso, o jornal deveria lhe servir de suporte e não abandoná-la a própria sorte.
A única nudez a ser castigada é a que deixa à mostra a falta de bondade e a moralidade hipócrita exposta na sociedade como um todo, da qual a jornalista é apenas mais uma vítima. É essa nudez que precisa ser combatida com coragem. E esse é também papel da imprensa que deseje estar a serviço da cidadania hoje e sempre.
Ao jornal resta dizer: Coragem! A ditadura já passou, recontrate a jornalista. Os cidadãos de Maringá que estão vestidos de bondade e bom-senso certamente aplaudirão esse gesto de grandeza de pé.
______________Em Maringá uma jornalista foi demitida após serem exibidas na internet fotos em que ela celebrava o ritual mais singelo que une homens e mulheres. E o que se festeja entre quatro paredes só diz respeito aos amantes. E certamente foi por estar envolvida pela cumplicidade gostosa que explode nos poros e na alma dos amantes que sob os lençóis não se lembram da existência de outro “mundo” senão, e tão somente aquele “mundo sagrado” das quatro paredes, que ela deixou-se fotografar.
Nenhum profissional que goze de suas faculdades mentais chega pela manhã e corre para sala do chefe para prestar-lhe relatório do que festejou no seu “mundo sagrado”. Só uma pessoa demente faz isso. Do mesmo modo espera-se que nenhuma empresa ou chefe saudável exija isso.
A jornalista em questão é física e mentalmente saudável, linda e competente. Mas assim mesmo foi demitida, castigada por sua nudez; a nudez explicita no relatório sexual do ex-qualquer coisa dela. Porque não dizer ex-amante? Não! Quem ama ou amou por anos, por uma noite ou 15 minutos, não faz isso. E observe-se, o relatório sexual era dele e não dela. Ela apenas teve a infelicidade de estar nele.
O ex não merece atenção, ela de certo já o superou e o grupo de pessoas que viu as fotos já deve lhe ter concedido um “título” a sua altura. A atenção deve voltar-se para a empresa. Ora vejam! Uma empresa de comunicação; a liberta imprensa, senhora de suas conquistas de liberdade plena. Todavia, como a jornalista não deveria ser julgada pela exibição criminosa de sua imagem, a empresa também não, pois na verdade ela ainda carrega o ranço do medo de outros tempos. Para entender melhor esse medo é necessário refletir a história do Brasil e quem sabe esperar por uma reconsideração da demissão da jornalista.
Em sua tese de doutorado sob o título: Cães de Guarda: Jornalistas e Censores do AI-5 à Constituição de 1988 - publicada pela editora Bomtempo, a historiadora Beatriz Kushnir desvendou o universo de jornalistas e órgãos de imprensa colaboradores da ditadura militar pós-68. A autora investigou a promíscua relação entre jornalistas e policiais, bem como os “esquemas” das empresas de comunicação para seguirem um roteiro de autocensura e assim, dançar no ritmo imposto pelo governo militar.
O foco do estudo foi averiguar a cumplicidade de profissionais da comunicação com os censores no Brasil de 1968 a 1988, concluindo que de fato muitos jornalistas atuavam como censores federais, ou seja, como jornalistas foram excelentes policiais nas redações. Em entrevista ao repórter Carlos de Melo do Conservatório da Imprensa ela diz: “Assim como nem todas as redações eram de esquerda, nem todos os jornalistas fizeram do ofício um ato de resistência ao arbítrio”.*
Dentre os jornais investigados pela autora, aparece a Folha da Tarde, o qual concluiu o estudo foi entre 1967 e 1984 reduto de um grupo de profissionais da imprensa chamados “cães de guarda”, pois conduziam a redação como uma delegacia de polícia. Segundo a autora, “o jornal ficou conhecido no meio jornalístico como o jornal de maior ‘tiragem’, uma ironia à grande presença de ‘tiras’ na redação”. *
Via-se, portanto, nesse período a conhecida lei: “Manda quem pode, obedece quem tem juízo”. Com a superação dos períodos da ditadura os que resistiram sem vender a alma, ajudaram a construir o aquilo que se conhece hoje como a “liberdade de impressa”. O país ganhou, todos os jornalistas ganharam entre eles os “cães de guarda”, retratados pela autora. Por tudo isso explica-se a mobilização contrária a tentativa da criação de uma agência reguladora dos meios de comunicação proposta pelo governo recentemente.
Hoje, entende-se que os profissionais da imprensa possuem “liberdade” para desempenhar seus papéis de informar. Nesse sentido as empresas de comunicação também atuam como parceiras-cúmplices de seus profissionais. Em outras palavras, o rádio, a revista ou o jornal zela pelo bem-estar de seus profissionais dando-lhes o suporte necessário ante as possíveis pressões ou e retaliações que possam surgir por parte dos governos ou da “ditadura” ferrenha da opinião pública. Mesmo e inclusive quando forem afetados fora do ambiente de trabalho, visto que pelo trabalho especifico que exercem tornam-se pessoas públicas.
Daí a diferença de repercussão das fotos da jornalista. Se ela fosse, por exemplo, auxiliar administrativo ou balconista o crime cometido contra ela não provocaria o medo em mantê-la no cargo. Não foi o caso, porque ela carrega sobre si o peso de pessoa pública advinda da sua função exercida no jornal, por isso, o jornal deveria lhe servir de suporte e não abandoná-la a própria sorte.
A única nudez a ser castigada é a que deixa à mostra a falta de bondade e a moralidade hipócrita exposta na sociedade como um todo, da qual a jornalista é apenas mais uma vítima. É essa nudez que precisa ser combatida com coragem. E esse é também papel da imprensa que deseje estar a serviço da cidadania hoje e sempre.
Ao jornal resta dizer: Coragem! A ditadura já passou, recontrate a jornalista. Os cidadãos de Maringá que estão vestidos de bondade e bom-senso certamente aplaudirão esse gesto de grandeza de pé.
Maria Newnum é pedagoga, mestre em teologia prática, vice-presidente do Movimento Ecumênico de Maringá e Conselheira no Conselho Municipal da Mulher de Maringá.
*Entrevista disponível aqui.
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6 pitacos:
Bom texto este!
Admirável defesa!
BELO TEXTO??? Como pode uma pessoa perder tempo escrevendo uma asneira como essa sem saber ao certo o que rolou entre a suposta vítima e a empresa??? Minha nossa, essa é a Maringá que nós conhecemos.
O texto em sí é excelente, nos leva a pensar que da vida íntima cada um cuida da sua e não deve torná-la pública, principalmente em ato tão estúpido como o ocorrido. A demissão da colunista mostra mais uma vez o autoritarismo reinante nesta cidade que de bela só tem as fotos (da cidade).
Parabéns Maria, nos faz muito bem saber que temos mulheres fortes e capazes de escrever texto de tão alta qualidade, e escrito com a lucidez de uma mulher de Deus. Quanto ao jornal, só podemos repudiar tal atitude e cada vez mais deixar de comprá-lo.
Não conheço a autora..... mas a agradeço. Lavou minha alma. Como homem me sentia, e ainda me sinto, envergonhado. A atitude do "acompanhante" foi vergonhosa, lastimável de todas as formas. Quanto à colunista, não se envergonhe, tenha orgulho, pois sei que naqueles momentos voce estava dedicando e se entregando a alguem em quem confiava. Voce não sabia que ele era um verme.
Não comparando, concordo que toda a traição merece repúdio. Tanto no caso da jornalista, que sofreu uma grande injustiça após suas imagens foram divulgadas publicamente por uma pessoa inconsequente e maldosa (traidora), como no caso do caseiro que revelou segredos do seu empregador, delatando-o na sua intimidade e colocando-o à execração pública.
Mesmo reconhecendo que atos como esses são condenados por todos os de bom censo, não faltam pessoas que se deliciam com a desgraça alheia.
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Vê lá o que vai escrever! Evite agressão e preconceito. Eu não vou mais colocar xizinho; na dúvida, não libero o comentário.