Propósito

Nasci em Maringá e meu pai, elevado a gerente da Comercial Catarinense, mudou com minha mãe pra Paranacity. Eu era um bebê muito frágil, magérrimo, e pra complicar a situação um dia caí da mesa da cozinha, rolei, acabei no banheiro. Minha mãe procurou os médicos das principais cidades da região - entre elas, Paranavaí, Nova Esperança e Maringá - e ninguém via cura pra minha fraqueza sem igual. O último médico a me desenganar foi daqui, dono de um hospital psiquiátrico, que sugeriu à minha mãe que retornasse a Paranacity e se resignasse com a morte que viria. No ônibus de volta a Paranacity (que nome massa pruma cidade, não é mesmo?) dona Doraci, ao ver uma freira sentada em outro banco, fez uma promessa: se Nossa Senhora Aparecida me curasse, adotaria uma outra criança e iria conhecer Aparecida do Norte para agradecer a graça.
Chegando em Paranacity eis que a cidade tinha um médico novo, recém-formado, e, claro, minha mãe me levou até ele. O homem receitou coisinha simples, comidinha simples. Não deu outra: estou até aqui hoje. Minha mãe adotou uma recém-nascida que escapou de ser morta pela mãe biológica num albergue de Maringá, muito tempo depois cumpriu o restante da promessa e conheceu Aparecida do Norte.
Eu, em 1980, como carona, me acidentei na avenida Brasil, a duas quadfras da Santa Casa, para onde fui levado, e levei 39 pontos no rosto; os óculos redondos me salvaram de ficar cego, pois quebrei o pára-brisas na cabeçada, e três dedos da mão esquerda sofreram cortes profundos mas até hoje funcionam. Em 1994, o pior acidente que tive, na Perimetral: um Gol cruzou a frente do meu Fuquinha (o famoso Tomate Assassino), que capotou e caiu em cima de mim, quebrando quatro costelas e provocando fratura craniana. Estudantes que deixavam o colégio levantaram o carro e uma boa alma me botou no banco no trás de seu veículo e me levou rapidinho ao Santa Rita. Em 2004, tomando café no Café Cremoso, já tendo ingerido meu Captopril, por causa da pressão (ah, Quality!), senti oscilação nas imagens; decidi voltar ao carro e reforçar a dose. Na volta ao café, já não sentia meu pé esquerdo; o Geraldo Irineu estranhou, ligou para o dr. Manoel Sobrinho, me levou pra seu gabinete em menos de 10 minutos. Sobrinho, ao me ver mancando, diagnosticou: isquemia cerebral temporária. Mais 15 minutinhos e eu estava internado no Santa Rita. Há uma semana aconteceu o infarto.
Saí de todos esses episódios de minha vida sem nenhuma seqüela - e olha que havia uma porção de ingrediente para que isso acontesse. No caso do infarto, e por minha culpa, houve uma demora de pelo menos seis horas para os procedimentos. Normalmente, me contou um médico, haveria seqüelas em forma de células mortas no coração - mas no entanto ele está "zerado", como "zerado" ficou meu pulmão, perfurado, em 1994. Como estamos no fim do ano, não tem jeito de não acreditar que exista um propósito nisso tudo.

PS - Pra quem gosta, aqui, um pequeno trecho do cateterismo.