30.4.06

Os bebês vêm de Maringá

Este artigo, de Ferreira Fernandes, está publicado no Correio da Manhã, de Portugal:

Esta crónica não é sobre Quaresma. Esta crónica não é sobre Quaresma. Esta crónica não é sobre Quaresma.

Ainda ontem, aqui no CM, falei do Scolari e do Quaresma. Que o melhor jogador do campeonato não seja convocado para o Mundial, deve ser uma dor de alma para o próprio. Nas tintas. A mim o que me custa, com a vontade que tenho em ser feliz em Junho, é que alguém me impeça de ficar eufórico daqui a um mês: “Viste aquele centro? Eh pá, mas tu viste mesmo aquele centro?!”... Mas, está bem, se já falei ontem não vou repetir-me.
Outro assunto. A presidente da Câmara de Vila de Rei, Irene Barata, olhou à volta e viu pouca gente. Então, mandou chamar 60 famílias brasileiras para povoar o concelho. Os primeiros chegam na quinta-feira. Vila de Rei é o exacto meio de Portugal. Pegue-se em Caminha, Paradela (Trás-os-Montes), Sagres e Vila Real de Santo António – desses quatro extremos de rectângulo tracem-se as diagonais. Estas encontram-se em Vila de Rei, o centro geodésico de Portugal. E também espelho demográfico do País. Vazio.
Aliás, esta semana José Sócrates falou do assunto: os portugueses estão muito ‘à la’ Morgado. Eu explico. Corria o ano de 1982, discutia-se o aborto na Assembleia da República e o deputado José Morgado proclamou da tribuna: “A Igreja Católica proíbe o aborto porque o acto sexual é só para procriar.”
A deputada Natália Correia fez um poema, logo ali: “Já que o coito, diz Morgado/tem como fim cristalino/preciso e imaculado/fazer menino ou menina/e cada vez que o varão/sexual petisco manduca/temos na procriação/prova de que houve truca-truca/sendo só pai de um rebento/lógica é a conclusão/de que o viril instrumento/só usou – parca ração! – uma vez./E se a função faz o órgão – diz o ditado –/consumada essa excepção/ficou capado o Morgado.” Portugal também está assim, a ponto de Sócrates penalizar os que dão pouco uso ao truca-truca e só têm um filho: os preguiçosos têm de pagar o défice da Segurança Social.
Irene Barata, não tendo os poderes de Sócrates para nos obrigar a procriar, teve a bela ideia de fazer os bebés vir, não de Paris, mas de Maringá, estado do Paraná, Brasil. Nos trópicos cresce-se rapidamente e eles chegam já com família feita. Um dos casais, dizia o ‘Expresso’, vinha com dois filhos. O dobro da fatídica unidade que é o pesadelo de Portugal.
Vila de Rei é o mais recente episódio da transformação de um país de emigrantes em país de imigrantes. O primeiro acordo de emigração que Portugal fez com um país foi com o reino do Havai. Nas últimas décadas do século XIX, o arquipélago ainda não pertencia aos Estados Unidos, era reino independente e quis famílias portuguesas porque elas eram famosas por fazer muitos filhos – que eram precisos para os campos de açúcar. O Havai ficou bem servido.
O mesmo acontecerá a Vila de Rei. Os imigrantes vêm de uma terra com nome bonito, de canção, Maringá. Depois, são brasileiros. Todos os brasileiros são bons, excepto quando não convocam Quaresma. Vila de Rei está aí para não me deixar mentir: no centro de Portugal todos são fãs do maior de Portugal em centros.
(*) Ferreira Fernandes é escritor e jornalista, vencedor do Prêmio Fernando Pessoa d Jornalismo de 1990 e principal articulisdta da revsita Sábado, de Portugal.

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