Os cassados na vida política
Por HEITOR BASTOS-TIGRE
O presidente Lula declarou que, se concorresse à reeleição, desejaria convidar para seu palanque de campanha o deputado cassado José Dirceu. E no horário político gratuito, o também deputado cassado Roberto Jefferson fez campanha para sua filha, a vereadora Cristiane Brasil.
Como isso é admissível, se o art. 337 do Código Eleitoral (lei 4.737/65) expressamente proíbe quem estiver com seus direitos políticos suspensos de: (i) participar de atos políticos (inclusive comícios) e (ii) fazer propaganda em recintos fechados e/ou abertos? Os efeitos da privação dos direitos políticos são inelegibilidade por 8 anos, impossibilidade de votar e de ser votado, de ocupar cargos políticos e de participar de atos políticos, sob pena de detenção de até seis meses e de 90 a 120 dias-multa, segundo o art. 337. O dispositivo legal determina que incorrem na mesma pena “o responsável pelas emissoras de rádio ou televisão que autorizar transmissões de que participem os mencionados neste artigo, bem como o diretor de jornal que lhes divulgar os pronunciamentos”.
De acordo com o jurista Pedro Roberto Péricles Prade, “...no que tange à participação de brasileiros que não estejam em pleno gozo de seus direitos políticos, a inconveniência de que façam parte do processo de escolha reside no fundamento lógico de que eleição se destina à escolha daqueles que irão integrar o Poder Executivo e Legislativo, e que, portanto, não estando no pleno exercício de tais direitos, não poderiam, pelo mesmo princípio, serem admitidos a participar da atividade político-partidária que desemboca na escolha de nossos representantes”.
Lembra Prade que “...a simples inclusão da imagem em peça de propaganda eleitoral, desde que evidente, com o objetivo de prestar apoio ao partido ou candidato que assim procede e, desde que com o conhecimento daquele que é retratado na peça de propaganda, já caracteriza o crime”.
O presidente Lula estaria incorrendo em idêntico delito se viesse a confirmar o convite ao amigo cassado. Cumpre à sua assessoria ficar mais atenta. No caso de Jefferson, o crime já ocorreu, e, por isso, devem ser indiciados, além dos autores, aqueles que colaboraram para que o ex-deputado, que perdeu seus direitos políticos depois de ruidoso processo amplamente divulgado pela mídia, e por isso de conhecimento geral, participasse das gravações.
A emissora de televisão e rádio não pode censurar a propaganda, que já chega pronta e selada, mas ao tomar conhecimento de que pessoas privadas de seus direitos fazem parte da programação eleitoral os gestores do meio de comunicação devem questionar a divulgação do material, ou mesmo tirar do ar a propaganda, sob pena de incorrerem no mesmo crime. Apenas enquanto não tomarem conhecimento do conteúdo do material a responsabilidade fica restrita aos candidatos e seus partidos políticos (art. 53 da lei 9.504/97).
No caso do presidente, sua declaração caracteriza por hora apenas o compromisso declarado de praticar um ilícito. Ninguém, nem o presidente da República, está escusado de cumprir a lei alegando que não a conhece (art. 3 da Lei de Introdução ao Código Civil). E a Constituição capitula como crime de responsabilidade (art. 85, VII) qualquer ato do presidente que atente contra o cumprimento das leis.
Portanto, seria mais prudente manter o José Dirceu longe dos palanques.
(*) Heitor Bastos-Tigre é advogado
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