Os três atos do cientista
Trechos de artigo de Jorge Wagensberg, diretor da Área de Ciência da Fundación La Caixa, publica no último dia 17 no El País (Espanha), via ex-blog de Cesar Maia:
Observar é buscar diferenças entre coisas similares. Compreender é encontrar semelhanças entre coisas diferentes. A ciência avança balanceando sem cessar entre observação e compreensão. A ciência se aproxima da arte afrouxando os parafusos do método científico. A arte à ciência, apertando-os. A ciência começa com a compreensão do mundo e acaba narrando histórias. A literatura começa narrando histórias, mas sempre olhando alguma compreensão da realidade. A ciência é a forma de conhecimento que mais se protege contra a ideologia e as crenças de seus criadores. A literatura envolve e transmite crenças, ideologias ou meras intuições.
O cientista, para lograr esta higiene ideológica, se impõe uma drástica cirurgia em três atos. O primeiro e mais doloroso consiste em expulsar o “Eu” de seus conteúdos. No segundo ato, decanta todo o presumivelmente supérfluo. E o terceiro ato consiste na perseguição implacável do erro. Paradoxalmente cada um destes três sacrifícios esconde um gozo intelectual. Separar o “Eu” da realidade é o prazer da conversação entre a mente e seu mundo exterior. Decantar o supérfluo produz o mais intenso dos gozos intelectuais, aquele que vem com toda nova compreensão ou com toda nova intuição. E a perseguição de contradições, arranca nada menos que o processo cognitivo inteiro.
Mas o cientista não publica tais gozos intelectuais. Na literatura, curiosamente, se invertem os termos. Se há algo prioritário procurado por um escritor quando escreve, ou por um leitor quando lê, é, justamente, alguma classe de gozo intelectual. Quiçá esteja aqui a chave de uma fecundação mútua entre ciência e literatura. A ciência se aproxima da literatura afrouxando os parafusos do método científico e a literatura à ciência, apertando-os. Delicadamente.
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