22.6.06

Lugar de mulher é na cozinha

Por MARIA NEWNUM

Quase nunca há impedimento para que as mulheres executem o trabalho pesado, o trabalho de base. Não há qualquer incômodo em aceitar que elas realizem o que desejarem nas cozinhas da vida; metidas entre as panelas engorduradas e impregnadas pelos cheiros de cebola e gordura rançosa; cheiro peculiar das cozinhas.
Na verdade esse cheiro quando exalado de um corpo de mulher, significa para alguns e algumas que ela está no seu devido lugar. E muito embora algumas insistam em usar excelentes perfumes é comum que assistam aquela movimentação de narizes que as rondam farejando freneticamente em sua volta, na tentativa de encontrar o cheiro “original” de cebola e gordura velha.
Esse movimento de narizes farejadores persegue as mulheres numa busca incessante em desqualificá-las de alguma forma. Muitas nem percebem e até se iludem quando recebem um elogio ou um reconhecimento público por algum mérito. Mas em muitos casos, atrás do reconhecimento, há o real desejo de enfatizar que apesar disso, o cheiro de cebola continua lá, latente na alma feminina e que independente disso, seu lugar continua sendo a cozinha.
Com relação às mulheres pobres e iletradas muitas vezes não há qualquer discrição e são vulgarmente acusadas de cheirar a “bacalhau velho”. Isso é chocante? Sim, mas não adianta tapar o sol com a peneira, esse é um fato vergonhoso que cerca ainda hoje o universo feminino no Brasil. Apesar dos homens bondosos e grandes da sociedade, parece prevalecer esse consenso de uma maioria impiedosa com as mulheres. Se assim não fosse, haveria muito mais mulheres fora das “cozinhas” da vida. Mas não há, elas continuam sendo minorias nos lugares de destaque da sociedade, incluindo o poder religioso, público e político do país, só para citar alguns exemplos. Ou será que são incapazes para essas funções? Claro que não. O problema é romper o “cheio de cozinha” e “bacalhau velho” imposto por certas espécies da sociedade.
O ranço fédito está na alma de alguns homens e infelizmente de muitas mulheres, já que é quase insignificante o número de mulheres que alcançam o espaço além-cozinha nas várias dimensões da sociedade mesmo sendo as mulheres maioria no país e em muitas organizações sociais. O que levanta um agravante: as mulheres são em grande parte as responsáveis pelo aprisionamento das outras e de si próprias nas cozinhas mal cheirosas da vida.
Ivone Gebara, em Poder e não-poder das mulheres p. 10, afirma que “em geral, a palavra poder como substantivo faz medo às mulheres pobres. [...] Dizer-lhes que, apesar de sua pobreza e situação, elas têm um certo poder parece ser para muitas uma forma de injúria ou de mentira. Ter poder parece estar misturado a tantas coisas ruins, que a gente sempre prefere dizer que não tem poder. Outros têm poder, não as mulheres pobres” e certamente as outras também.
A cada período eleitoral no país e nas organizações sociais, as mulheres têm a chance de exercer o seu poder democrático através do voto nas mulheres, no entanto, é comum que elas continuem contribuindo para o ostracismo de suas pares deixando-as, pela força de um voto masculinizado, nas cozinhas do Brasil, nas igrejas e das diversas organizações. Há aquelas que votam num homem só porque ele é bonitinho. Nem sabem que, na maioria das vezes, “o bonitinho”, não está nem aí para construir casas, postos de saúde, escolas, ampliar o acesso ao emprego; não está nem aí para as coisas das mulheres. Ao contrário muitos deles apenas se interessam em construir túneis, viadutos ou estradas com os seus devidos nomes. Já viram alguma dessas construções com nome de mulher? Apesar de tudo isso, as mulheres continuam votando nos bonitinhos e nos falastrões de terno e gravata como que se dissessem que eles nasceram para brilhar nos salões e as mulheres para viverem entre as panelas pegajosas.
Enquanto não houver plena consciência desse dado por parte das mulheres, o slogan horroroso “lugar de mulher é na cozinha, esquentando a barriga no tanque e esfriando na pia”, continuará insuperável, apesar do esforço de algumas e alguns.
É preciso acreditar: A cozinha não nos pertence mais...
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(*) Maria Newnum é pedagoga, mestre em teologia prática, vice-presidente do Movimento Ecumênico de Maringá e Conselheira no Conselho Municipal da Mulher de Maringá.
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Outros artigos de Maria em http://www.maringanews.com.br/ e http://www.alcnoticias.org/?lanCode=3

2 pitacos:

Anônimo,  14:18  

Concordo com a Maria. As mulheres e suas vassouras já conquistaram muito mais que a cozinha. A sala, os quartos, os banheiros e a área de serviço são delas e ninguém tasca!

Anônimo,  21:49  

Joca

Que comentário infeliz, preconceituoso e sem nenhuma consideração pela figura valorosa, corajosa, amorosa, dedicada e competemnte das mulheres!!!
Quanto machismo!!!

Muitas mulheres de nossa querida Maringá deixaram-se sim influenciar pela " beleza" ( particularmente não o acho bonito) de Sua Majestade e deu no que deu!
Estamos todos sofrendo as consequências do voto sem consciência!

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