1.3.06

O melhor de todos os dias

Por OSMAR DIAS:

Para quem desfruta hoje dos avanços da tecnologia e usufrui as grandes transformações que o Brasil experimentou desde o fim do século, é quase impossível imaginar como viviam os brasileiros na década dos anos 30. Enquanto a Segunda Guerra Mundial apavorava um mundo com poucas e atrasadas informações, cada homem ou mulher aqui nascidos ou qualquer um da grande legião de imigrantes que começaram a povoar, principalmente o Sul e o Sudeste de nosso país, obrigou-se a travar uma luta diária pela sobrevivência em tempos terrivelmente difíceis.
A busca por condições mais favoráveis para ofertar o mínimo de conforto e segurança à família exigia sacrifícios e muita bravura. Milhares foram os homens que, distantes dos parentes, por semanas e até meses, transformaram-se em permanentes peregrinos à procura de um lugar onde pudessem construir um futuro mais seguro.
Muito foram os paulistas, mineiros, gaúchos que percorreram as terras paranaenses, viajando nas mais precárias situações. Foi assim que em 1938, o meu pai, Silvino Fernandes Dias, não se importou em viajar sobre o bagageiro de uma velha jardineira saindo de Quatá, em São Paulo, para dias depois finalmente chegar aonde futuramente cresceria uma das maiores e mais modernas cidades de nosso país, a bela Londrina.
À época, a cidade não era mais do que um local de pouso para os pioneiros e troca do meio de transporte. Se até lá a viagem foi árdua, enfrentando o barro e a poeira, era no outro dia que a situação passaria a exigir ainda mais coragem e destemor.
Na mata fechada e abundante em perobas, ipês, cedros e incontáveis espécies que simbolizavam a exuberante fertilidade das terras roxas do Norte do Paraná, só havia um caminho estreito, onde somente era possível percorrer a cavalo.
E foi assim, sobre o lombo de um cavalo, que dias depois Seu Silvino chegou a outro lugarejo que hoje abriga os moradores de Mandaguari.
Ali, estava o escritório ou o ponto de vendas, da Sinop, a empresa de ingleses que iria colonizar praticamente todo o Norte do Paraná.
Com 27 anos, Silvino Dias teve ousadia e visão suficientes para ir em frente e fez uma exigência que seria decisiva na definição do seu futuro: queria que lhe levassem até uma área com abundância de água e que ficasse a menos de 10 km do traçado da ferrovia que já estava projetada.
Percorreu mais 30 km e chegou ao local que se chamava “fim da picada”. Aliás, esse ainda é o nome de um dos pontos mais habitados de uma das mais belas cidades do Brasil: Maringá.
Percorreu a pé picadas abertas na mata densa da região e não teve dúvidas: adquiriu cem alqueires, exatamente como havia exigido. Terra fértil, com nascente de água e próxima do traçado da “estrada de ferro”. Com a escritura das terras nas mãos, enfrentou o mesmo caminho de volta.
Mas o sonho de começar uma vida nova atenuou o sofrimento da sacrificante viagem. Não imaginava nem de longe que acabara de inscrever-se como um dos pioneiros de Maringá, aqueles que transformariam a mata daqueles confins do Noroeste do Paraná em uma região próspera, de uma agricultura das mais avançadas do mundo e, com o passar dos tempos, numa cidade admirada por todos pela sua beleza e pela qualidade de vida que oferece aos seus habitantes.
De 1938 até 1954, foram inúmeras as viagens que realizou até mudar-se definitivamente com toda a família para a nova fazenda, já formada com a cultura de café.
A cafeicultura vivia tempos áureos e proporcionava novas oportunidades de negócios na própria região. Éramos, então, uma família de nove irmãos, todos nascidos em Quatá, que recebíamos do Seu Silvino e de Dona Helena rigorosa formação. Trabalhar na lavoura e freqüentar a escola eram regras que não permitiam qualquer complacência.
Quando nasceu Terezinha, a única mulher da família, em 1955, a Fazenda já estava praticamente formada, mas o trabalho ficava cada vez mais intenso e também a ela coube cumprir os rigores de uma formação que não aceitava qualquer desvio de caráter ou ausência do trabalho e dos estudos.
E foi assim que um casal que não teve sequer a oportunidade de concluir o então curso primário exigiu de seus filhos formação superior.
Mas a formação acadêmica foi apenas um componente do que nos proporcionaram.
Com ele aprendemos muito mais, com seus exemplos, com suas atitudes. As regras rígidas na freqüência ao trabalho diário, a honestidade absoluta nos ofícios e nas atividades, o respeito e tratamento igualitário aos funcionários da fazenda fizeram com que as pessoas percebessem que ali vivia um casal que levava muito a sério a religião, a dignidade, o cumprimento da palavra, a honra.
Hoje, a Fazenda Diamante não existe mais. Ficava muito perto da estrada de ferro, e foi aos poucos sendo transformada em uma significativa área da cidade de Maringá.
Com o resultado da venda e do loteamento da velha fazenda, Silvino Dias foi adquirindo novas áreas e, generoso com os filhos, foi aos poucos repassando a todos o seu patrimônio, construído com inteligência, mas, sobretudo, com absoluta honestidade e dignidade que o fizeram um homem rico em respeito e honradez.
Ensinou aos filhos que o Brasil oferece oportunidade a quem tiver coragem para investir, no Paraná ou em outros estados para, com trabalho e decência, desbravar novas áreas e criar oportunidades de emprego digno a outras pessoas.
Assim, como os paulistas, mineiros, gaúchos e tantos outros migrantes que construíram o Paraná que tanto nos orgulha, Seu Silvino Dias deixou-nos esse sábio ensinamento:
O Brasil é dos brasileiros e somos nós que temos o direito e, principalmente, o dever de levar a outros estados o que aqui aprendemos, para que assim nossos irmãos também possam receber do nosso trabalho e do nosso conhecimento os frutos do desenvolvimento descentralizado, para que todos possam viver com mais dignidade e respeito.
O Paraná deve a seus pioneiros e desbravadores o progresso que se espalha por todas as regiões. Porém muitos estados devem aos paranaenses, filhos daqueles pioneiros, a distribuição do desenvolvimento que lhes oferece a oportunidade de trabalho e de sustento de suas famílias.
Esses paranaenses que, ousadamente, levam a outros estados as virtudes admiráveis do nosso Paraná, merecem muito respeito de todos, porque a exemplo dos nossos pioneiros, enfrentam igualmente as agruras que se apresentam na implantação de novos projetos, que vão transformar o Brasil numa nação soberana e sem tantas desigualdades sociais.
Pelo país afora, milhares de paranaenses plantaram e continuam a contribuir para o surgimento de novas cidades, a partir dos seus sacrifícios e investimentos. Acredito que o Seu Silvino, ao transferir aos seus filhos esse espírito de luta e trabalho, deu sua contribuição à construção de um país mais igual, mais justo...
Meu pai completou 95 anos de idade no dia 17 de fevereiro. São 95 anos de honradez e dignidade. Nunca alguém testemunhou este homem descumprir sua palavra.
Obrigado, meu pai, por essa herança de formação que nos deixou! Todos nós temos a certeza de que recebemos uma graça divina por tê-lo como nosso pai.
Deus nos ajude, a cada um dos seus filhos, a seguir sempre os seus passos, os seus exemplos e a sua conduta de honradez e honestidade.

(*) Osmar Dias é um dos dez filhos de Silvino Fernandes Dias e senador do Paraná

2 pitacos:

Anônimo,  13:18  

Meu pai não era assim como o do Osmar.

Era trabalhador, foi malufista e depois se arrependeu. Morreu com câncer com 73 anos endividado, sem nada. Trabalhou a vida inteira como um louco danado.

Anônimo,  17:28  

O que deu no Osmar? Tão carrancudo ficou mansinho ao falar do papai?

Nunca vi este homem sorrir. Falar nesta linguagem próximos das eleições...

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